segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Olimpíada de Lingua Portuguesa- Escrevendo o Futuro.

A Olimpiada de Lingua Portuguesa - 2010, com o tema "O lugar onde vivo" deu oportunidade para que professores de todo o Brasil trabalhasse os gêneros: poema, memória literária, crônica e artigo de opinião a partir de sequencia didática organizada em oficinas.
Foram mais de 7 milhões de alunos em todo o Brasil.

Participar da Olimpíada e chegar a semifinal com Memória, foi íncrível. A aluna Natália Dutra de Oliveira-13 anos, do 8º ano, escreveu: Nas Trilhas do Passado, uma história baseada na entrevista realizada com Zezão-63 anos, ex ferroviário.

O relato de prática, escrito a partir da experiência com a realização das atividades ao longo das oficinas, foi selecionado como o melhor da região Nordeste I.


RELATO DE PRÁTICA

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Maria Vioneide Linhares


Os primeiros dias de aula foram suficientes para perceber que após quatro anos exercendo a função de gestora, era preciso reestabelecer uma nova relação com meus alunos. Estávamos muito mais próximos agora. Era hora de transformar aquele silêncio e quietude em uma dinâmica que os mobilizassem, sem perder de vista a aprendizagem e o avanço próprio àquele ano escolar.

A chegada do material da Olimpíada de Língua Portuguesa- escrevendo o futuro, era tudo o que eu precisava. Não pensei duas vezes, levei o material para casa e me debrucei sobre ele como alguém que sentia uma arrebatadora “fome”. Foram dias lendo, pesquisando na internet. Como leciono em turmas de 8º e 9º anos, me dediquei aos gêneros: Memória e Crônica, me tornando amante dos dois.
Não foi difícil falar da Olimpíada para eles, pois conheciam a proposta através das propagandas de TV. Não me prendi ao concurso. Apresentei o gênero e propus trabalharmos as oficinas. O tema: “O lugar onde vivo”, foi bem acolhido. Naquele momento eu era toda “ouvidos”... E muitas histórias antigas, fatos, objetos e lugares daquela cidadezinha pé de serra, foram relembradas ao tom de: assim diz a minha avó! E os mais velhos viraram celebridades. A todo instante um aluno batia à sua porta para entrevistá-lo.
Agora sim, aquele clima estava mudando de verdade e eu sabia que podia ficar ainda melhor. Ninguém ficou parado, foi mesmo com a exposição. Aquilo era mesmo uma mobilização. Pegamos juntos alguns dos abjetos adquiridos por eles. Foi nessa etapa que todos os segmentos da escola se envolveram no trabalho, mas bom mesmo foi ver os pais chegando à escola com os braços cheios de objetos antigos ou mesmo apreciando o resultado da exposição. Aquilo foi como uma festa para eles. Todas as turmas da nossa escola e outros visitantes puderam ver objetos antigos e conhecer com eles um pouco da história da nossa cidade.
Depois do sucesso da exposição, foi fácil fazer com eles o plano de trabalho. Muitos demonstraram dificuldade para organizar os textos a partir das entrevistas e alguns até tiveram que voltar ao entrevistado ou mesmo substituí-lo. Compartilhar o texto com os colegas ajudou bastante na superação dessas dificuldades. Após algumas leituras e análises comparativas era preciso saber como estavam suas produções no gênero. Dessa forma conheceria as suas necessidades e poderia me preparar melhor para as intervenções. Li cuidadosamente cada texto produzido, embora isso me custasse algumas noites de sono. Deixei anotações animadoras. Sabia que o grande desafio seria reescrever os textos. Muitos se negavam a fazer tudo de novo. Mas era tudo uma questão de tempo, jeito e paciência. Só estávamos começando.
Dali em diante os conteúdos propostos para o ano letivo se misturavam aos realizados nas oficinas. Buscávamos no livro didático reforço a assuntos inerentes ao gênero como: o tempo dos verbos, narrativas em 1ª e 3ª pessoa, figuras de linguagem, sinais de pontuação e outros. Com esses assuntos alguns pareciam se desmotivar. Quando isso acontecia era hora de usar o plano “B” ...E lá íamos nós... Nada que uma leitura compartilhada não resolvesse, e pra isso qualquer lugar servia: o pátio, os banquinhos embaixo das árvores e mesmo a sala de leitura era o lugar ideal para mais uma memória, afinal eu precisava manter a empolgação da turma.
A leitura era fundamental naquele momento das oficinas. Trabalhamos todos os textos da coletânea, das mais variadas formas: leitura compartilhada, leitura feita pela professora, leitura fatiada, em áudio e com auxílio do projetor. Sempre iniciávamos a aula com um capítulo do livro: “Memórias de um menino que se tornou estrangeiro”, além disso, cada aluno dispunha de um livro da biblioteca da escola para ler em casa.
Aquela garotada paradinha do inicio do ano não existia mais, eles gostavam mesmo era de agitação e como já começavam a reclamar das coletâneas, nada melhor que preparar uma entrevista com duas das pessoas citadas por eles no inicio do trabalho. Não deu outra. Tudo estava pronto e eles nem conseguiam disfarçar tanta ansiedade. Na hora marcada nossos convidados compareceram entusiasmados e orgulhosos pelo convite. Seu Cici (63 anos) contou histórias incríveis da época em que o transporte em nossa cidade era o trem. Falou de amores, comércio, convivências familiares da época. Dona Terezinha (72 anos) abordou fatos políticos e religiosos marcantes dando ênfase aos desfiles realizados pelas escolas em datas comemorativas e das dificuldades financeiras daquele povo. Essas entrevistas foram transformadas em textos numa atividade coletiva, que rendeu comentários e risos com erros e acertos, mas tudo num clima harmonioso, embora em alguns momentos precisasse falar mais alto.
Era chegada à hora de por a mão na massa... Digo no lápis. Aquela seria a primeira versão do texto final. Com o tema escolhido, muitos voltaram ao entrevistado para colher mais detalhes. Os relatos dos entrevistados agora eram concebidos com muito mais significado... Nesse momento cada detalhe era muito importante. Agora sim, estávamos cada vez mais próximos, tratava-se de um momento de troca e pra isso acontecer, se fazia necessário um clima de muita confiança, adquirido durante todo o processo. Eu lia os textos, deixava os comentários e eles refaziam. Muitos reclamavam e queriam desistir. Reproduzi e entreguei para cada um, as sugestões de aprimoramento com trechos de textos e um roteiro para revisão. Retomei o texto: “Como num filme” e fizemos uma leitura minuciosa com auxilio do datashow e alguns dos textos por eles produzidos, foram lidos para toda a turma.
É notório o avanço nas produções ao compararmos os primeiros textos produzidos por eles. Até mesmo os textos que apresentam poucas características do gênero de memórias, avançaram considerando o nível em que estavam. As produções finais foram surpreendentes. Combinamos preparar um livro para lançamento com noite de autógrafo no final do ano letivo em curso e finalmente decidimos que os textos deviam sim, participar do concurso. O projeto me deu um jeito novo de caminhar e esse percurso eu faço lado a lado com meus alunos.

MARIA VIONEIDE LINHARES- Pedagoga, especialista em Psicopedagogia (FIP) e Gestão Escolar (UFRN), Professora de Língua Portuguesa nas turmas de 8º e 9º ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Dr. Xavier Fernandes- Patu/RN, 2010